Rodrigo Fonseca
Envernizado de elegância pela luz de Guillaume Schiffman, hoje um dos maiores fotógrafos da Europa, indicado ao Oscar por “O artista” (2011), “Meu anjo”, que estreia na TV brasileira na semana que vem, transborda sensorialidade em seu empenho de registrar, com tintas poética, a dor do desarranjo afetivo em uma relação de maternidade. O olfato é o signo que a cineasta estreante Vanessa Filho (francesa de origem ibérica) usa para sintetizar a dor da ausência na delicada produção que a Rede Telecine exibe na terça-feira que vem, dia 4, às 22h. Na sequência de maior impacto de “Gueule d’ange” (título original deste longa), a pequena Eli (Ayline Aksoy-Etaix) se delicia com o aroma do perfume de Marlène (Marion Cotillard, em impecável atuação) para aplacar a saudade com o cheiro do amor ausente. No filme de Vanessa, a eterna Piaf (laureada com o Oscar de Melhor Atriz há dez anos) faz de Marlène alguém que não sabe administrar todas as responsabilidades inerentes aos compromissos maternais. Boêmia de carterinha, ela se ocupa mais com sua rotina de excessos do que com as necessidades da menina, até que passa dos limites. Na dramaturgia, Vanessa faz o que pode para não incorrer em moralismos: não é uma história para difamar Marlène, é, sim, uma reflexão sobre a sobrevivência do carinho e suas possíveis regenerações.