Por Myrna Silveira Brandão, de Nova York

O cineasta Rithy Panh, nascido no Camboja, perdeu toda a sua família e antes de fugir para um campo de refugiados na Tailândia em 1979 e depois se radicar na França, procurou respostas que explicassem todo esse drama. Após décadas de busca em jornais e arquivos, chegou à conclusão de que a imagem que estava procurando não existe.

“The missing picture”, seu novo filme, é uma tentativa de documentar essa jornada e criar suas próprias imagens através do cinema.

O filme, totalmente fora do convencional, foi muito aplaudido  na concorrida sessão prévia para imprensa nesta 51ª edição do Festival de Nova York e também integra a seleção do Festival do Rio (26 de setembro a 10 de outubro).

Contada  através de imagens de bonecos de barro, a história é narrada na voz de Randal Douc, representando um homem agora em seus 50 anos olhando para o seu passado.

Em tom neutro, ele vai explicando os distintos episódios que afetam os  personagens, desde ações cotidianas como os trabalhos agrícolas até aqueles mais dramáticos em face da progressiva ameaça dos guerrilheiros.

Vindo de Cannes, onde ganhou o prêmio de melhor filme na mostra Un Certain Regard, “The missing picture” homenageia e questiona o poder da imagem, com um tom terno, evocativo e auto reflexivo, destacando as que estão perdidas e as que foram encontradas;  as que são palpáveis e as que são invisíveis;  e as que são comoventes ou eticamente duvidosas.

A coletiva com o diretor – da qual participou o Laboratório Pop – ultrapassou o horário previsto para terminar e muitas perguntas certamente deixaram de ser feitas. Leia os principais trechos daquelas que Panh, pacientemente, respondeu para a curiosa plateia que lotou o auditório do Lincoln Center.

Por que quis contar a história através de figuras de barro?


Rithy Panh – Inicialmente porque queríamos centrar a história sob o ponto de vista da criança. Além disso,  na cultura asiática, essas figuras não são apenas uma obra de arte, são consideradas como tendo uma alma. Por último, estas figuras são feitas de argila e água, basicamente como nós que viemos e vamos voltar para a terra.

Qual a razão de mostrar o artista as esculpindo?


RP – As estatuetas não existiam antes, foram criadas para o filme pelo escultor e foi a primeira vez que ele fez algo assim, porque na verdade, ele é um carpinteiro e não um escultor. O processo foi muito difícil porque, como vocês viram, não é algo animado. As estatuetas são pequenas, fixas,  não se movem, então tivemos que movê-las, darmos vida para elas.

Como foi a escolha da pessoa que narra a  história?

RP – Ela é narrada por Randal, que não é um ator, é um matemático, que também escreve roteiros, e eu o escolhi porque gostei de sua voz. Eu queria que as pessoas se concentrassem na história que é contada e não na pessoa famosa que está por trás, como é feito hoje em dia em desenhos animados em que atores famosos são escolhidos  para fazer a narração. Eu queria evitar que qualquer coisa interferisse com a história.

Qual o significado da imagem  no início e conclusão do filme, com ondas quebrando na areia?


RP – Quando estamos submersos em nossas memórias, elas vão e voltam, como ondas.  Às vezes, nos sentimos como se estivéssemos nos afogando  da forma como é representado nas cenas.

Você foi o primeiro cineasta cambojano a ganhar um prêmio em Cannes. O que representou isso?

RP – Quando a gente vai a um festival do porte de Cannes ou deste aqui o NYFF,  não podemos antecipar nada, mas ao final,  só podemos ter duas reações: ficamos desapontados porque as coisas não foram tão bem, ou felizes porque as coisas foram bem.  Essa última opção foi o que aconteceu lá e aqui.