Rodrigo Fonseca
Um dos maiores cineastas latino-americanos da atualidade, o colombiano Ciro Guerra (de “O abraço da serpente”) demonstrou ser um presidente do júri dos mais audaciosos para a seção Semana da Crítica, do Festival de Cannes, ao driblar a aposta em narrativas realistas ou de tom documental, e valorizar uma animação de tintas fantásticas: o Grande Prêmio Nespresso da disputada mostra ficou com “J’ai perdu mon corps”. Em 2018, o vencedor foi a delirante fábula lusa “Diamantino”, feita em coprodução com o Brasil. Desta vez, a visita ao fantástico ficou mais soturna: o longa vencedor, dirigido por Jérémy Clapin, é uma reflexão sobre desapego. A protagonista desta aula de ironia é uma mãozinha, tipo aquela da Família Addams, mas sem humor. Ela quer achar o corpo de seu “dono”, hoje envolvido num caso de amor complicado. Hakim Faris dubla o personagem principal.
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Os dois piores longas na briga pela Palma de Ouro de 2019 foram vistos nesta quarta-feira: o canadense Matthias et Maxime”, dirigido e estrelado por Xavier Dolan, e o francês “Roubaix, une lumière”, de Arnaud Desplechin. O primeiro acompanha uma história de descoberta do desejo entre dois homens, grandes amigos, em meio à participação de ambos em um filme no qual precisam se beijar. O falatório excessivo embota o fluxo narrativo habitualmente veloz do realizador de “Mommy” (2014) pela falta de vigor dos personagens, que parecem esboços de gente. Desplechin, por sua vez, frustrou a crítica com a tentativa de construir um filme sobre a rotina policial de agentes de uma das regiões mais violentas e miseráveis do Velho Mundo. A falta de intimidade do realizador de “Um conto de Natal” (2008) com a cartilha dos thrillers faz com que as tramas paralelas do cotidiano de uma delegacia se atropelem, minando o ritmo.
Nesta sexta, Sylvester Stallone vem a Cannes para receber uma homenagem pelo conjunto de sua carreira e exibir imagens inéditas de “Rambo – Last Blood”, que vai lançar em setembro. De quebra, ele aproveita a passagem pela Croisette para participar de uma projeção de gala de uma versão digital inédita de “Rambo – Programado para matar” (1982).
Estima-se que, neste sábado, Stallone será convidado para anunciar o ganhador da Palma de Ouro em nome do júri presidido pelo cineasta mexicano Alejandro González Iñarritu. Até agora o favorito segue sendo “Dor e glória”, do espanhol Pedro Almodóvar, com Antonio Banderas no papel de um cineasta que revê seu passado em meio a um problema gástrico e uma visita ao mundo das drogas. Quentin Tarantino, que vem dividindo opiniões com seu “Era uma vez em Hollywood”, não deve sair do balneário sem prêmios. Um dia antes da cerimônia que vai encerrar a edição nº 72 do festival, serão entregues os prêmios da seção Um Certo Olhar (Un Certain Regard), que tem em Karim Aïnouz e seu “A vida invisível de Eurídice Gusmão” um ímã de láureas, incluindo alguma possível menção ao desempenho de Fernanda Montenegro.