RODRIGO FONSECA
Uma das sensações de Cannes, “Bacurau”, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, vai abrir o 47º Festival de Gramado (16 a 24 de agosto), em projeção hors-concours.Três anos depois de conquistar a Palma de Ouro dos documentários, o troféu L’Oeil d’Or, com “Cinema Novo”, o Brasil saiu de Cannes com uma honraria que consagra sua luta política. Ao gritar “Um beijo para todo mundo no Recife” no Palais des Festivals de Cannes, com o Prêmio do Júri, Kleber, consagrado mundialmente com “Aquarius” (2016), estava fazendo mais do que afago em sua terra natal, em meio à consagração na disputa oficial da mais prestigiada seleção competitiva do mundo: seu gesto de carinho é um indicativo de sua curiosidade acerca da carreira nacional de “Bacurau”. Ao lado dele, no palco da Croisette, o também pernambucano Juliano Dornelles fez algo parecido em seu discurso: chamou a atenção da imprensa mundial acerca da crise que se instaura no Brasil em meio ao clima de caça às bruxas que cerca quem vive de cultura ou de educação no país. Ao serem contemplados com o terceiro prêmio mais importante do evento francês – a Palma ficou com o sul-coreano Bong Joon Ho, por “Parasite”, e o Grand Prix com a francesa de origem senegalesa Mati Diop, por “Atlantique” -, os dois diretores demonstraram estar com a cabeça na realidade brasileira. A vitória deles veio na decisão do time de jurados presidido pelo cineasta mexicano Alejandro González Iñárritu (de “Birdman”) em criar empate entre dois longas que traduzem o desajuste social de seus países num ambiente de barbárie: “Les Miserábles”, de Ladj Ly, foi o escolhido para dividir a o prêmio com Dornelles e Kleber. No thriller dirigido por esse francês de origem maliana, três policiais enfrentam uma rebelião dos moradores de um subúrbio majoritariamente negro de Paris em retaliação a uma agressão contra um menino daquela periferia. O povo se levanta contra uma instituição de controle. “Bacurau” mostra uma situação parecida: os habitantes da cidadezinha sertaneja que dá título ao longa se insurgem contra um célula de assassinos estrangeiros, chefiados por um alemão (Udo Kier), que coordena uma caça a pessoas pobres. Sonia Braga integra o elenco no papel de uma médica com surtos de fúria, sempre que exagera no álcool. Fotografia de Pedro Sotero.