Cinema

Berlinale 2020: Nolasco fala ao LP sobre “Vento seco”

Por Laboratório Pop


Myrna Silveira Brandão, de Berlim

Daniel Nolasco lançou “Vento seco”, seu novo filme, na prestigiada mostra Panorama da 70ª edição do Festival de Berlim. A obra é ambientada numa pequena cidade no interior de Goiás e no mês de junho, quando o vento seco e a baixa umidade do ar ressecam a pele dos moradores. Sandro divide seus dias entre o trabalho, o futebol com amigos e o relacionamento com Ricardo, seu colega de trabalho. Mas as coisas começam a mudar com a chegada de Maicon, um rapaz que desperta seu interesse.

Em entrevista ao LABORATÓRIO POP antes da sessão, Nolasco falou sobre o filme, a motivação para realizá-lo, o significado da exibição em Berlim e – como todos os brasileiros que estão aqui – não deixou de fazer referência à situação atual da cultura no Brasil.

Como vê o filme fora do Brasil?

O público de festival normalmente é mais aberto a filmes que fujam de estruturas e narrativas convencionais e a Berlinale também tem tradição de exibir filmes que abordam o universo LGBT. Então acho que isso tudo pode ajudar na reação positiva ao filme. E apesar de todas as particularidades que “Vento seco” tem que possa dificultar o diálogo com o público, como a regionalidade que não é tão conhecida e decodificada por um público internacional, a história do filme é, no final das contas, um romance. E histórias de amor todo o mundo entende.

O que representa ter a première mundial de “Vento Seco” em Berlim e na prestigiada Panorama?

“Acredito que fazer a estreia mundial do “Vento seco” no festival de Berlim na Panorama no momento histórico que estamos vivendo acaba significando diversas coisas. Desde coisas mais práticas que decorrem da exibição do “Vento seco” em um festival com tanta visibilidade, bem como as discussões que possam surgir sobre o filme; ou como essa estreia pode impactar positivamente na sua distribuição tanto internacional quanto no Brasil. Outra coisa é que o cinema brasileiro tem marcado presença significativa no Festival de Berlim nos últimos anos. Penso que isso é um dos resultados de várias políticas públicas que vinham sendo desenvolvidas e aprimoradas e que agora se encontram ameaçadas.

“Vento Seco” é resultado dessas políticas que vinham sendo executadas?

“Sim, é resultado de duas políticas – a de descentralização da produção audiovisual que possibilitou a produção de diversas obras em todas as regiões do país; e do Prodecine 05, que era voltado para produção de filmes que propunham novas narrativas e diferentes estéticas. Diante disso e do que está acontecendo em relação à produção audiovisual do país, a participação não só do “Vento seco” na Berlinale, mas até todos os outros filmes brasileiros e profissionais da área, acabam ganhando outras camadas e significados”.

Qual a motivação para ter feito o filme?

“Eu nasci e fui criado em Catalão, uma pequena cidade interior de Goiás que é também o cenário do filme. Aos 27 anos me mudei para o Rio de Janeiro para fazer faculdade de cinema. Morando no Rio eu percebi como as pessoas que viveram a vida toda em um centro urbano desconheciam que existia uma vivência gay em cidades do interior como a que eu nasci. Uma das principais motivações vem da vontade de mostrar parte da diversidade, da riqueza e as particularidades dessas vivências e subjetividades. Outra forte motivação vinha da vontade de filmar Catalão, suas paisagens, seus habitantes, hábitos, festas, etc. Esse é o primeiro filme de ficção gravado na cidade.