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Bon Iver está de volta com disco apaixonante

Em Sable, Fable Justin Vernon confirma a posição de gênio da sua geração

por Robert Halfoun

 

 

Depois de um hiato de cinco anos, a Bon Iver retorna com Sable, Fable, um disco que caminha por trilhas já exploradas, mas ainda surpreendentemente férteis. Desde For Emma, Forever Ago (2007), o projeto de Justin Vernon nunca se contentou com a repetição. Em vez disso, ele construiu uma discografia como um arquipélago: ilhas sonoras distintas, mas interligadas por sentimentos comuns de perda, reinvenção e beleza fragmentada. Sable, Fable se encaixa perfeitamente nesse mapa.

O álbum é ao mesmo tempo íntimo e indecifrável. O título já sugere essa duplicidade: sable, evocando a escuridão aveludada, e fable, remetendo à linguagem dos mitos — como se Vernon estivesse nos contando histórias em código Morse emocional. Musicalmente, o disco mergulha ainda mais fundo nas experimentações digitais que marcaram 22, A Million (2016) e i,i (2019), mas sem abandonar completamente os timbres orgânicos que cimentaram sua base indie-folk.

Logo na faixa de abertura, “Things Behind Things”, o ouvinte é puxado para um mundo que é etéreo e lindo, com melodias finas e arranjo no qual a voz inconfundível de Justin Vernon conduz a o belo dedilhados das guitarras. A canção parece uma versão sonâmbula de um hino, onde cada pausa fala tanto quanto cada nota.

Mas se há algo que torna Sable, Fable apaixonante é a alma que pulsa em cada faixa — uma alma transbordante, que escapa pelas rachaduras do vocoder, pelos reverbs longos, pelos coros descompassados. Vernon não esconde mais a emoção por trás da abstração: ele a amplifica, a dissolve, a reconstrói em glitchs e harmonias comoventes. O disco é um corpo vivo, eletrônico e ao mesmo tempo espiritual. Ouça e apaixone-se por “Everything Is Peaceful Love”.

Liricamente, Vernon continua no terreno críptico. Nunca foi direto — prefere esboços emocionais a narrativas fechadas. Ele compõe com as palavras como quem pinta com aquarela: borrando significados, sugerindo climas. Há ecos de espiritualidade, política sussurrada e uma sensibilidade ecológica latente, como se o disco quisesse tanto falar do mundo quanto fugir dele.

Difícil definir um ponto alto em Sable, Fable, a obra toda se completa e fala por si. Algo onde a melancolia folk encontra o glitch-hop, uma combinação improvável que Vernon transforma em epifania. Ao todo são 13 faixas, alguma em que a voz surge quase a capela, num convite à escuta paciente e reflexiva.

Bon Iver, mais uma vez, constrói um disco que parece falar diretamente ao subconsciente — um espaço onde palavras viram texturas, melodias se dissolvem em memória e o silêncio é parte da composição.

Se For Emma era a caverna emocional do eremita e 22, A Million o colapso cósmico do artista genial, Sable, Fable parece ser o resultado de quem aprendeu a habitar num meio-termo no qual, mais do que tudo, Vernon encontra beleza no fim do túnel.

Resumindo, estamos falando de um disco bonito pra cacete.