RODRIGO FONSECA
Injustos são os ataques a “Adão Negro” (“Black Adam”), aventura baseada em HQs DC Comics que chegou aos cinemas na quinta-feira com a promessa de se tornar uma das maiores rendas de Hollywood neste ano em que “Batman”, de Matt Reeves, trouxe prestígio para o trânsito da Warner Bros. pela mitologia dos gibis. E “mitologia” é um verbeto preciso para um personagem que nasce de feitiçaria, tornando-se uma divindade aspirante encarnada em todo o carisma de Dwayne Johnson, o eterno The Rock. Mas quem vem roubando a cena não é um dos coadjuvantes (apesar do sucesso de Pierce Brosnan, como Sr. Destino, ao lado de Adão), e, sim, a expectativa pelo regresso de Herny Cavill como Homem de Aço. Parece que Hollywood anda afoita por Superman. E é possível assistir ao lendário longa sobre o herói, feito em 1978 por Richard Donner (1930-2021) na grade da HBO Max.
Há uma centelha lúdica em tudo o que RicDonner e o escritor Mario Gianluigi Puzo (1920-1999), autor do romance “O poderoso chefão”, imprimiram no script da mais famosa transposição do guardião de Metrópolis para as telas. De março de 1977 a novembro de 1978, o cineasta que acaba de nos deixar torrou um orçamento de US$ 55 milhões para filmar e finalizar uma adaptação cinematográfica das HQs de Jerry Siegel (1914-1996) e Joe Shuster (1914-1992). Antes dele, Guy Hamilton e Steven Spielberg foram cotados para assumir a direção. Egresso do sucesso de “A profecia” (1976), Donner rodou “Superman — O filme” em locações em Nova York, no Arizona, em São Francisco e no Novo México, além de Alberta no Canadá. Usou ainda os estúdios Pinewood e Shepperton, na Inglaterra, para filmar algumas cenas do longa-metragem, cuja bilheteria chegou a US$ 300 milhões. Cada reencontro com esta obra-prima do Pop reforça o talento de Margot Kidder (1948-2018), atriz canadense que deu de presente aos cinéfilos a mais sublime Lois Lane.
James Caan, Burt Reynolds, Kris Kristofferson e Nick Nolte foram cotados para viver Kal-El, o único (supostamente) sobrevivente do planeta Krypton. Este alien reside na Terra sob a identidade de Clark Kent, um repórter. Mas o papel acabou com Christopher Reeve (1952–2004), cuja atuação (irretocável) só é ofuscada pela de Gene Hackman como criminoso Lex Luthor. Na dublagem original, gravada pela Herbert Richers, André Filho emprestava a voz a Reeve. Darcy Pedrosa dublou Hackman. Na redublagem, nos anos 1990, Luiz Feier Motta assume a dublagem de Reeve.
Vale lembrar que o histórico do personagem nas telonas e telinhas foi atribulado. Seu bom mocismo, ainda estacionado em ditames morais dos anos 1930, e sua indestrutibilidade não mais encontram ressonância em um público hoje acostumado à malícia do Homem de Ferro de Robert Downey Jr. ou ao instinto assassino do Wolverine. Nos EUA, seus gibis caem nas vendas ano a ano. Vendem bem só quando um coadjuvante de luxo (em geral, o Batman) divide quadrinhos com ele, ou quando um quadrinista transgressor repagina seu perfil, como John Byrne na década de 1980 ou como Grant Morrison em “All-Star Superman”, de 2006.
Há uma aposta pela aparição de Cavill nos créditos de “Adão Negro” e na possível sequência do longa com Dwayne. Enquanto isso, HQs do personagem inundam as bancas no Brasil, via Panini Comics. É ela quem edita o Superman por aqui.
Pipocam no site da Panini ofertas de dois gibis envolvendo o anti-herói, outrora vilão. Um dos títulos é “Os Arquivos Secretos da Sociedade da Justiça” e o outro, “A Era das Trevas”. Com um visual parecido com o do Capitão Marvel (alter ego de Billy Batson, mais conhecido por seu grito, “Shazam!”), o personagem foi criado por Otto Binder e C. C. Beck, e apareceu pela primeira vez numa HQ da Fawcett Comics, “The Marvel Family”, numa edição do Natal de 1945. Por anos a fio, até o Shazam ser incorporado pela DC, nos anos 1970, o Adão Negro, chamado Teth-Adam, era o algoz do vigilante do Olimpo. Mas, a partir dos anos 1990, com os quadrinhos de Jerry Ordway, o terrorista com poderes oriundos da magia dos deuses virou uma espécie de protetor da Terra. Daí o interesse de um astro como Dwayne The Rock Johnson numa figura tão controversa.
Encarado como um potencial blockbuster, o novo filme de Dwayne, “Black Adam” no original, foi dirigido pelo catalão Jaume Collet-Serra (de “A Órfã”) e vai mostrar a saga de um homem escravizado que ganha poderes mágicos similares aos do Shazam. Num depoimento dado durante o evento nerd DC Fandome, em 2020, Johnson deixou claro que a ira é o norte de Adão, embora tenha desmitificado sua clássica representação como um agente do crime. “Seria ótimo se Adão Negro andasse com o Superman. Eles poderiam ser amigos. Ou não…” ironizou o astro, que mostrou croquis animados do projeto, na ocasião.
Agora é esperar essa pancadaria.