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‘Conclave’ reza o credo da ética

Filme laureado com o Globo de Ouro de Roteiro estreia no Brasil no dia 23

Por Rodrigo Fonseca

Rodrigo Fonseca
Laureado com o Globo de Ouro de Melhor Roteiro no último domingo, “Conclave” vai estrear no Brasil no dia 23, pouco depois do anúncio das indicações para o Oscar 2025, agendadas para 19 de janeiro, quando seu título pode (e merece) figurar em múltiplas frentes. Seja por sua ambientação vinculada aos signos do cristianismo, seja por seu clima de mistério, o thriller que encerrou o último Festival do Rio evoca “O Nome da Rosa” (1986). O cult de Jean-Jacques Annaud, baseado em Umberto Eco (1932-2016), não fez parte do rol de referências explícitas do diretor austro-suíço (nascido em terras alemãs) Edward Berger na concepção da narrativa sobre bastidores da sucessão papal. Pelo menos, em suas citações públicas, feitas em várias entrevistas, ele referiu-se mais a suspenses políticos feitos nos Estados Unidos na década de 1970. Mesmo assim, é difícil não lembrarmos de um Sean Connery (1930-2020) de batina, investigando crimes no seio da Igreja, ao acompanharmos a batalha moral empreendida por um cardeal ungido pelo óleo da retidão. Essa figura é encarnada por Ralph Fiennes, numa atuação devastadora. Ele encarna o cardeal Thomas, responsável por gerenciar a eleição do novo sumo pontífice em meio a uma guerra de egos. Tudo se passa num Vaticano acossado por ameaças terroristas.
Esse contexto eleitoral poderia, no máximo, render um drama sobre disputas de ego. Nas mãos do oscarizado realizador do épico bélico “Nada De Novo No Front” (ganhador da douradíssima estatueta hollywoodiana de Melhor Filme Internacional de 2023), ele vira uma eletrizante aula de tensão pautada na dinâmica jogos de poder. Essa aula foi aplaudida no último Festival de San Sebastián, onde disputou a Concha de Ouro.
Com base em romance de Robert Harris, “Conclave” foi roteirizado pelo inglês Peter Straughan (de “O Espião Que Sabia Demais”). Seu enredo expõe o avanço de uma direita xenófoba, sexista e homofóbica rondando a passagem de bastão no seio eclesiástico dos arredores de Roma, após a morte do Papa. Uma escolha errada para ocupar o lugar de Sua Santidade pode resultar num retrocesso capaz de dar fim a todos os avanços que a religião católica esboçou (ou tentou esboçar) na luta para expiar seus pecados. Em meio à troca de estadista, uma estratégia digna de uma partida de “War” (famoso jogo de tabuleiro) se estabelece conforme o (já citado) sacerdote Thomas Lawrence (papel de Fiennes) assume a tarefa de conduzir os votos de seus colegas.

Tem muito sacerdote querendo essa vaga, como a raposa velha Tremblay (John Lithgow), o moderado Bellini (Stanley Tucci, sempre afiado), o ascendente Adeyemi (Lucian Msamati) e o mais perigoso de todos, o fascista Tedesco (Sergio Castellitto, em avassaladora interpretação). Em meio a eles, uma freira (Isabella Rossellini, na mais sólida interpretação de sua carreira) parece saber segredos que podem alterar o destino do Vaticano. Ao avaliar o perigo que o espreita, Thomas diz: “Certeza é o inimigo da unidade. Certeza é o inimigo da tolerância”.
No Brasil, mitos da dublagem nacional emprestam a voz ao elenco de Berger, a começar pela escalação do bamba Márcio Simões para ceder seu gogó a Fiennes. Rosa Maria Baroli dubla Isabella nessa produção de US$ 20 milhões, que já faturou cerca de US$ 60 milhões.
Estima-se que Berger vá concorrer ao Urso de Ouro da Berlinale .75 (a ser realizada de 13 a 23 de fevereiro, na Alemanha) com “The Ballad of a Small Player”, protagonizado por Colin Farrell e Tilda Swinton.