RODRIGO FONSECA
Clássico dos clássicos da “Sessão da Tarde” desde o início dos anos 1990, “Curtindo a Vida Adoidado” (“Ferris Bueller’s Day Off”, 1986), de John Hughes (1950-2009), será exibido na Berlinale .73 neste sábado, às 16h do horário alemão (12h no Brasil), integrando um brilhante recorte dos curadores do festival germânico, Mariette Rissenbeek e Carlo Chatrian, dedicado a filmes do passado que propuseram olhares autorais sobre a juventude. A escolha do que seria (e será) exibido nessa seção, batizada de Retrospectiva, foi feita por medalhões da indústria. Mariette e Carlo deram sinal verde a cineastas (Martin Scorsese, por exemplo, que escolheu passar “Antes da Revolução”, de Bernardo Bertolucci) e estrelas (uma delas, Juliette Binoche, quis revisitar seu próprio trabalho em “A Liberdade É Azul”) que focaram em seus xodós. De Pedro Almodóvar (que festejou o melodrama juvenil, ao jogar luz sobre “O Clamor do Sexo”) à realizadora Ava DuVernay (que aborda a luta antirracista com “Rue Cases Nègres”, da diretora Euzhan Palcy), essa mostra terá uma seleção das mais ricas de Berlim este ano, com direito até a Matthew Broderick no papel que lhe valeu uma indicação ao Globo de Ouro. Papel esse que se imortalizou em nosso imaginário com a dublagem antológica de Nizo Neto. Quem decidiu que esse cult pop seria exibido foi a cineasta e atriz libanesa Nadine Labaki (“Cafarnaum”).

Aula de picardia, “Curtindo a Vida Adoidado” custou US$ 5 milhões e faturou US$ 70 milhões narrando as peripécias de um popularíssimo estudante, Ferris (Broderick, então com 24 anos), que dribla todas as normas escolares, alegando estar doente, para matar aula. Leva consigo a namorada, Sloane (Mia Sara), e o melhor amigo, Cameron (Alan Ruck). Seu maior feito é subir num dos carros alegóricos de uma parada e assumir o microfone na hora em que “Twist and Shout”, dos Beatles, é tocado, a todo vapor.

Na presidência do júri da Berlinale deste ano, a atriz Kristen Stewart optou por “Agora e Sempre” (“Now and Then”, 1995), que traz Christina Ricci e Demi Moore no elenco. Jurado em 2022, o diretor M. Night Shyamalan (hoje em cartaz com “Batem À Porta”) escolheu “ A Última Sessão de Cinema” (1971), de Peter Bogdanovich. Um dos mais badalados retratos da dor de amadurecer já filmados, “Rumble Fish – O Selvagem da Motocicleta” (1983), de Francis Ford Coppola, vai ser exibido na Alemanha graças a um palpite do ator Ethan Hawke.

Um título fora de concurso fez bonito na Berlinale na sexta: “Laggiù Qualcuno Mi Ama” (em inglês “Massimo Troisi: Somebody Down There Likes Me”), que é uma cartaz de amor em forma de longa-metragem realizada pelo napolitano Mario Martone (de “Nostalgia”) sobre um de seus ídolos: o astro italiano de “O Carteiro e o Poeta” (1994). Nascido nos arredores de Nápoles e morto em Óstia, aos 41 anos, por complicações cardíacas pouco antes de receber uma indicação ao Oscar, Troisi foi um ator brilhante, que utilizada a simplicidade aparente como disfarce para o improviso. Dividiu o troféu Copa Volpi de Melhor Ator com Marcello Mastroianni, em 1989, por “Que Horas São?” (“Che ora è?”), de Ettore Scola, com quem fez ainda “Splendor” (1989) e “A Viagem do Capitão Tornado” (1990). Martone mostra que a relevância de Massimo para a depuração do audiovisual italiano nos anos 1980 (um momento de declínio para a pátria de Fellini) se estende a experiências dele como realizador, com um espírito cronista que pode ser conferido em “Só Nos Resta Chorar”, codirigido por Roberto Benigni, em 1984, e “Ricomincio Da Tre”, de 1981.
Ainda nessa leva nostálgica acerca da Itália de outrora, o festival abre espaço em sua Berlinale Special, neste sábado, para exibir “Sogni d’Oro” (1981), de Nanni Moretti.

Produção canadense, “BlackBerry” está em concurso pelo Urso de Ouro

Vai ter Berlinale até o dia 26 de fevereiro. Até o momento ainda não há apostas acerca de um potencial favorito, apesar da boa acolhida ao concorrente canadense “BlackBerry”, sobre boom da telefonia móvel, apoiado no carisma de Jay Baruchel. O longa de Sean Penn sobre a Ucrânia, o documentário “Superpower”, teve uma recepção beeeem azeda por parte da crítica. Espera-se que a passagem de “Ingeborg Bachmann – Journey Into the Desert”, de Margarethe von Trotta, neste fim de semana, mude esse qudro. Aos 80 anos, a diretora de diretora de “Hannah Arendt – Ideias Que Chocaram o Mundo” (2012) segue fiel a seu cinema biográfico e escala Vicky Krieps para interpretar a escritora e poeta austríaca Ingeborg Bachmann (1926-1973, autora de “O Tempo Adiado”. Seu lema: “A verdade é razoável para o homem”.