O primeiro disco solo do Hermano Rodrigo Amarante, “Cavalo”, é a continuação de seu eterno caminho sem saída. Compositor que se esconde num forçado minimalismo para disfarçar suas limitações melódico-harmônicas, Amarante faz uma versão pálida e envergonhada do bom CD de estreia de Marcelo Camelo, “Sou”. Seu disco é o famoso “me engana que eu gosto”. Nesse sentido, Amarante é bem-sucedido, isso não se pode negar. Afinal, com sangue contaminado de poeira musical, ele participou de uma das maiores bandas pop nacionais de todos os tempos, empunhou a guitarra quando viu que seu trompete desafinado e seu pandeirinho de foca não iam dar ibope e agora, ao que parece, pode se firmar como compositor de e para Mp3. Enganando.

Investindo em silêncios, silêncios que nas mãos erradas são os principais recursos dos medíocres, Amarante faz uma misturada de nada: cruza a mesmice do rock indie americano numa chupada orgânica nova-iorquina pós-punk em “Hourglass”, baladeia quase sozinho em “Nada em vão”, que sintetiza sua MPB oca, arregimentando tosco arranjo, e atravessa o disco inteiro saindo da Padaria Rio-Lisboa para ir ao Talho Capixaba (ao lado) e voltando. São muitos minutos com essa imagem cinema-musical. Como sair para comprar pão 20 vezes em dois lugares diferentes.

A sensação é de que o disco não passa a segunda marcha. E é isso mesmo. Já em “4”, dos Hermanos, Amarante já dava sinais de que suas composições tinham um limítrofe torque de inspiração e café no bule. As melodias andavam de um lado para o outro, para cima e para baixo, sem chegar a lugar algum. Tal impressão se reforça quando Amarante faz mais uma incursão à língua francesa em “Mon nom”, catando cavaco do folk e misturando rock low-fi com filtros vocais experimentais, tentando soar erudito – um erudito cafona.

“Irene”, que um romancista amigo classificou de “é linda que doi”, é para estudo antropológico – Amarante engana até intelectuais e isso é um termômetro do que essa lorota pode provocar na inteligentzia média. Isso porque Amarante, que já tentou lá fora pagar de roqueiro indie americano com o Little Joy e fez sua banda se traumatizar tanto que até mudou de nome (Hot Danny), comete um bem engendrado suicídio harmônico. A melodia é rasa, sem cor, sem luz, mascarada de black blocks rítmicos, e se veste de um violão que, a princípio, e só a princípio, pode soar para o amigo escritor como caetanista. E é. Não necessariamente isso é bom porque nesse caso estamos falando de uma decupação paupérrima das fantásticas levadas de Caetano. É ruim. É muito, muito ruim. É, repetindo mais  duas vezes, muito ruim, muito ruim.

Amarante segue com seu atestado quebra-mola de carro novo tentando prospectar fãs de Marcelo Camelo e Los Hermanos num disco sem riscos. Já que o CD de rock do Little Joy, outra invencionice malsucedida, não funcionou, vamos atacar de viola que estudantes e ex-estudantes da PUC de todo o Brasil aplaudirão.

“Maná”, quase um jazz-bossa-samba-rock-brazuca com suinge da Noruega, espetaculariza e ridiculariza a música popular brasileira, ao empregar eletrônica totalmente disforme na mania recorrente de Amarante de arrastar seu canto numa displicência proposital que põe o desfecho sem desfecho.

O silêncio, aquele, aquele lá em cima, do mal, é novamente incorporado em “Fall asleep”, com um teclado que faria Joe Jackson se jogar debaixo de um táxi de indiano na Times Square. Sua sequência harmônica, infantil, com reverb de igreja, mantém acesa a linha Rio-Lisboa -Talho Capixaba, só que fim de madrugada, diante do Jobi e do Diagonal fechados. Melancolia loser.

O problema de um disco de Rodrigo Amarante é que ele é, como diria o baixista Felipe Cambraia, desarrumado para sair de casa. Tem a sujeirinha indie, as características de um disco MPopB para agradar, uma pseudo-sofisticação para ser visto como grande e um sapato velho para calçar referências hermânicas. É tudo muito previsível, embora produzido para ser exatamente o contrário. E a previsibilidade está exatamente aí.

Amarante persegue fórmulas prontas para ressaltar e reacender sua fama hermânica. Mas a cada faixa fica claro que ele foi o sujeito certo na banda certinha. Ao longo do disco e do meio para a frente, ele emula o disco para trás;  de “Tardei” até a inacreditável faixa-título o disco começa a se repetir até causar um incômodo sono maldormido.

Sabe aquele cavalo que dispara na frente e quando chega perto de cruzar a reta final começa a desacelerar e trotar de lado, como que desobedecendo ao jóquei? “Cavalo” é assim. Ele não obedece a uma regra básica de corrida de cavalo: seu jóquei não treinou muito para ir para a pista. Nem trotando.