Por Luciano Vianna
Conheci Mario Marques, o MM, em meados dos anos 90, quando ambos ingressamos, no mesmo mês, no jornal “O Globo”. Por termos estudado na mesma universidade e cultuarmos música com paixão desmedida, nossa amizade fluiu como água. De lá para cá nos encontramos em muitas empreitadas distintas. Ambosdeixamos “O Globo”, ambos trabalhamos no “Jornal do Brasil”, ambos criamos uma das últimas revistas de rock com sede no Rio de Janeiro, a “Laboratório Pop”, embrião da agência LabPop e da Music Buzz, que nos mantêm sócios ate hoje.“Música é passado – Tudo o que você precisa saber antes de ouvir porcarias”, seu terceiro livro, é um chute no saco da indústria fonográfica e um golpe duro no imenso lixo musical no qual o Brasil está mergulhado.
Ame-o ou odeie-o, Mario Marques não tem meio termo. Um dos mais polêmicos (e por si só instigantes) críticos de música do Brasil, da nossa geração, ele tem algo que só os grandes jornalistas têm: confiança no seu próprio paladar musical. Mario destróiartistas popularescos e levanta ounderground ou vice versa com a mesma facilidade e leveza na escrita. Não importa se existe uma grande gravadora por trás, se o artista é chato, se ele é um megastar ou um ícone indie. Concorde ou não, MM sempre tem argumentos para nos convencer, de seu ponto de vista, mesmo quando a maioria dos seus companheiros de crítica musical não concordava com suas controversas opiniões.
O livro é um apanhado de reportagens, perfis, entrevistas, críticas, crônicas e artigos publicados entre 1989 e 2009, ano em que MM abandona o jornalismo cultural e migra para o marketing. “Música é passado” está desenhado há uns 12 anos, mas só ganha a luz agora. “Música é passado” leva o leitor a conhecer saborosas histórias da música brasileira e gringa das últimas décadas. Tudo sobre o olhar crítico particular de Mario, testemunha viva dos melhores anos do underground 90s no Abrilpro Rock, do surgimento dos artistas do movimento recifense do Mangue Beat e da nova MPB com os cariocas do Los Hermanos, além de um dos primeiros a entrevistar Cassia Eller e de ser um obcecado admirador do compositor gaúcho Nei Lisboa na grande imprensa. Os 17 capítulos do livro mostram um jornalista-escritor que passeia com maestria por diversos estilos, sem medo de destilar suas teses.
Lembro-me de, em 1999, o MM passar uns dias em minha casa em Londres, quando passei uma temporada por lá. Qualquer crítico de música passaria dia e noite procurando shows na cidade. Mas MarioMarques preferiu se trancafiar no apartamento para ouvir os CDs e fitas-cassete indie que eu colecionara em meu selo London Burning. Batemos papos infindáveis sobre aqueles sons, até o dia em que fomos convocados a entrevistar Jay Kay, vocalista do Jamiroquai, um dos capítulos deste livro.
Ainda em 2021 sai o romance “Tudo acabou ontem”
Mario Marques deu uma guinada radical em sua jornada a partir de 2009. Virou um dos mais requisitados estrategistas de marketing político do Brasil, tendo lançado o cultuado “Voto do futuro” em 2019, bíblia de mandatários brasileiros. Deixou adormecida, portanto, sua ligação com a música, só aflorada em nossa convivência na Music Buzz, agência de entretenimento que tocamos juntos. Seu foco é mesmo o marketing político, sua segunda paixão, fornida desde moleque na convivência com seu pai.
Desde 2019 encontro Mario Marques quasemonotemático, um sujeito que só tem conversa sobre livros, livros e livros. Este ano ele deve lançar mais 4: “Voto do futuro 2”, “Pesquisas qualitativas – pega a direção” (com João Nonato), “Eu amo Nova Iguaçu” (biografia de seu pai) e o romance “Tudo acabou ontem”. Tornou-se um escritor dos grandes, que será muito lido e relido por aí.
Nesses tempos tão sombrios, nos quais a lacração vale muito mais do que o talento musical, “Música é passado – Tudo o que você precisa saber antes de ouvir porcarias”é um documento único, necessário, para entender o caminho tortuoso que transformou a música numa arte menor.
• Luciano Vianna é jornalista, criador da Festa Ploc e Diretor Executivo da Music Buzz