Concorrente brasileiro à Palma de Ouro de Cannes de 2024, “Motel Destino” é um suspense eletrizante que dialoga com uma tradição de thrillers exercitados no início da década de 80 por realizadores de grife autoral como os irmãos Coen. É uma narrativa de reviravoltas bruscas, sem medo nenhum do erotismo, calcada em um triângulo amoroso que se forma num hotel de beira de estrada no Ceará.
O tal motel do título, é uma espécie de quarto personagem e entre suas paredes, embaladas por gemidos altos e decoradas com pinturas quase expressionistas, residem vivências de amores fugazes e encontros de hora marcada. É lá que o personagem Heraldo, interpretado por Iago Xavier, vai se envolver com a responsável pelo estabelecimento, Dayana, encarnada magistralmente por Nataly Rocha. Ela ri quando fica nervosa, é um riso tenso. Tão tenso quanto o clima de conflito que começa a se estruturar naquele espaço, conforme o dono (um devastador Fábio Assunção) se vê obrigado a acolher um desvalido.
O desvalido em questão é Heraldo, que trabalha para uma rede de crime, mas tem o sonho de ir para São Paulo montar uma oficina mecânica. Ao cometer um erro, ele precisa se esconder e acaba se enfurnando no Destino. É lá que vai viver mais uma das aventuras letais que fazem do seu cotidiano um convite ao perigo. Karim Aïnouz demonstra uma maestria invejável na direção, apoiando-se numa fotografia sinestésica. A engenharia sonora amplia os vetores de desestabilização daquela atmosfera.
Karim é um realizador bifurcado entre ficções e documentários de temas e olhares muito distintos. Falou de si e de seu pai em “Marinheiro das Montanhas” (2021) ao mesmo tempo em que falou de um campo de refugiados em Berlim em “Aeroporto Central” (Prêmio da Anistia Internacional na Berlinale em 2018). Em terreno ficcional, pisou sempre nas questões do desejo e da afirmação da vontade feminina, até em “Firebrand” (2023), sua estreia na língua inglesa, falando da monarquia com Alicia Vikander e Jude Law. Cada história que conta é uma peça de um puzzle sinestésico no qual ele representa o querer.