RODRIGO FONSECA
Coroado múltiplas vezes na Berlinale, em edições dos anos 2010 para cá, o Irã já assegurou para si sua primeira safra de láureas na maratona cinéfila germânica de 2024. Considersdo o mais forte concorrente ao Urso de Ouro, a doce love story iraniana “My Favourite Cake”, da dupla Maryam Moghaddam e Behtash Sanaeeha, conquistou o Prêmio do Júri Ecumênico na manhã deste sábado na capital alemã. Sexta à noite, o concorrente do Irã (que foi censurada pelo regime político de sua pátria, num veto à presença de seus realizadores) foi agraciada com o Prêmio da Crítica, concedido pela Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica (Fipresci). A mesma instituição coroou uma trama multinacional que se passa no Brasil e tem Kleber Mendonça Filho e Emilie Lesclaux (de “O Som ao Redor”) como coprodutores: “Dormir De Olhos Abertos”, de Nele Wohlatz.
Encarado como um dos mais encantadores achados da Berlinale 2024, “My Favourite Cake” é uma trama outonal envolvendo dois septuagenários: uma viúva e um taxista. Na direção, Maryam e Behtash são acusados de desafiar os códigos morais iranianos em relação ao uso de hijab, uma espécie de touca (com aspecto de véu), que cobre a cabeça feminina de forma bem justa. A interdição da presença de Maryam e Behtash foi recebida pela direção do Festival de Berlim como um atentado à liberdade de expressão e um retrocesso em relação ao tratamento das mulheres.
“Decidimos ultrapassar as restrições legais e pintar um retrato real das mulheres iranianas”, disseram os realizadores numa carta lida diante da imprensa pela atriz e jornalista Lily Farhadpour, que protagoniza “My Favourite Cake” ao lado de Esmaeel Mehrabi.
Ela vive Mahin, que perdeu o marido há cerca de três décadas, criou (bem) a filha e hoje vive sozinha, aos 70 anos. Na mesma idade, o motorista Faramarz (papel de Esmaeel) também lida com a solidão em seu dia a dia. Porém, durante uma noite, num encontro casual, eles vão provar do gostinho do benquerer.
Debruçado ainda sobre as seções paralelas da Berlinale, o Júri Ecumênico laureou também o norueguês “Sex”, de Dag Johan Haugerud, e o letão “Marijas Klusums”, de Dávis Simanis. Houve ainda menção honrosa para “Intecepted”, de Oksana Karpovych, da Ucrânia.
A mesma cerimônia que premiou “My Favourite Cake” coroou um thriller eletrizante (estrelado por Omar Sy) com o Prêmio da Anistia Internacional: “The Stranger’s Cake”, de Brandt Andersen. Seu enredo se expande por múltiplos personagens ligados aos conflitos da Síria, entrando num fluxo migratório – abordado sob múltiplas vias.
“Precisamos dar voz ao que se passa. A voz de vocês importa. Minha voz importa. Não somos estranhos ao que se passa”, disse Brandt.
Anualmente, o Sindicato de Cinemas Arthouse da Alemanha entrega um prêmio no penúltimo dia da Berlinale. A produção laureada deste ano foi o alemão “Dying” (“Sterben” no original), de Matthias Glesner. É um devastador painel familar formado a partir do trabalho de um maestro (Lars Eidinger) na regência de uma sinfonia.
No anúncio do título a ser agraciado com o Cinema Vision 14 Plus, a Berlinale anunciou “Last Swim”, de Sasha Nathwani. Já o júri da Confédération Internationale des Cinémas d’Art et d’Essai
(CICAE) também flertou com a força ausiovisual do Irã e laureou “Shahid”, de Narges Kalhor. A confederação premiou o ainda o já citado “Sex”, da Escandinávia.
Desde a década de 1970, a Berlinale abre espaço para o prêmio do público leitor do jornal “Berliner Morgenpost”, que, nesta edição foi atribuída ao supracitado “Dying”. Uma versão do longa em forma de minissérie de TV vai ser lançada este ano.
A ala leitora do periódico “Tagesspiegel” também dá um prêmio no festival, e o faz há 20 anos. Sua escolha: “Une Familie”, um .doc de tons autobiográfico da escritora francesa Christine Angot, que concorre a troféus na seção Encounters.
A Berlinale anuncia o resultado das deliberações do júri oficial, presisido pela atriz Lupita Nyong’o, esta noite. No domingo, sai o resultado do júri popular do evento, que gravita em torno dos títulos da mostra Panorama.