por Myrna Silveira Brandão, de Nova York
Após o sucesso de Turnê, o ator e diretor Mathieu Amalric retorna com La chambre bleue, seu novo filme, bem recebido ontem na sessão para o público e na prévia para a imprensa da 52ª edição do Festival de Nova York.
Adaptado do livro homônimo do belga Georges Simenon, a história retrata a relação doentia entre um homem (Amalric) e uma mulher (Stéphanie Cléau) passada praticamente dentro do quarto de um hotel no campo.
La chambre bleue é um filme noir, atemporal, impregnado de erotismo, culpa, desespero e o início de consciência do personagem que ele pode estar entrando num labirinto sem retorno.
Na coletiva após a projeção, Amalric disse que o filme aconteceu por causa do produtor Paulo Branco.
“Comecei como assistente do Paulo aos 20 anos. No ano passado esbarrei com ele na rua. Ele sabia que eu estava trabalhando no roteiro de Rouge et le noir (de Stendhal), mas me perguntou se eu gostaria de fazer alguma coisa em três semanas, ou seja filmar algo nesse período de tempo. Voltei para casa, dei uma olhada naqueles livros que costumamos deixar de lado e me deparei com um pequeno livro azul, que conheço bem. Foi assim que decidi fazer Chambre bleue”, contou.
Sobre a perfeita adequação da música ao viés do filme, Amalric disse que quando estava escrevendo o roteiro pensou muito em qual tipo de música colocaria em cada sequência e nada lhe ocorria.
“Aí o nosso engenheiro de som, que conhece bastante música, sugeriu que tentássemos músicas calmas para sequências calmas e mais fortes para as cenas de suspense. Por exemplo, em algumas delas, colocamos a Rapsódia Espanhola, de Ravel, que é uma música passional”.
Um jornalista aproveitou a deixa para perguntar a Amalric como definiria um crime passional.
“A pergunta é engraçada, até parecida com as que o juiz fazia para o réu no inquérito”, brincou Amalric ressaltando que é uma definição difícil para ser feita em poucas palavras.
“Prefiro lembrar que Simenon dizia que qualquer um é passível de cometer um crime passional”, despistou o diretor mudando de assunto e contando que reviu muitos filmes antes de começar a filmar.
“Num primeiro instante, os filmes noir da RKO, aquelas histórias de suspense, paixão, líricas e angustiantes, de Jacques Tourneur, Otto Preminger, Fritz Lang… Mas também A mulher do lado, de François Truffaut, Eu te amo, eu te amo, de Alain Resnais e O atalante, de Jean Vigo”.
Amalric se entusiasma ao lembrar passagens das filmagens, principalmente cenas finais do julgamento.
“Os últimos dias das filmagens, as do processo foram incríveis. Nós abrimos para o público o tribunal de instância desativado de Baugé, onde filmávamos. Mostramos o juiz chegando, os juramentos, as declarações e assim por diante. Havia uma multidão para assistir, eles gritaram, aplaudiram, foi um momento muito especial”, ressaltou.
Afirmando que pretende continuar seu trabalho também atrás das câmeras, Amalric diz que nem ele sabe qual será o próximo projeto.
“Não sabia também quando ou se faria este, antes de o Paulo ser o desencadeador de La chambre bleue. Gosto das encomendas, dos desejos e das intuições das outras pessoas. Enquanto isso, vou continuar o meu trabalho escrevendo Rouge et le noir, ”, revela Amalric, que estreou aos 18 anos em Les favoris de la lune, de Otar Iosseliani, e desde então tem tido muito sucesso também como ator em filmes como O escafandro e a borboleta, Ervas daninhas e A questão humana.