Rodrigo Fonseca
Prestes a iniciar sua carreira brasileira, pelas telas de Gramado, o curta carioca “Pássaro Memória” arrebata os corações e os olhares do público europeu em sua passagem – em concurso – pela seção Pardo Di Domani do Festival de Locarno, na Suíça. Seu realizador, Leonardo Martinelli, concorreu lá em 2021, com “Fantasma Neon”, e saiu laureado com o prêmio principal. Volta agora às salas de projeção helvéticas para exibir a saga de uma jovem (Ayla Gabriela) em busca de uma ave perdida.
Nesta quarta-feira, Martinelli anunciou que vai exibir seu filme no Festival de Toronto (TIFF), no Canadá. Na foto abaixo, o cineasta, Ayla e o produtor Rafael Teixeira exibem o cartaz do (belo) filme na praça de Locarno.
O que filmes como Pássaro Memória te permitem descobrir sobre o Rio de Janeiro, em especial durante as filmagens?
Leonardo Martinelli: Como procuramos retratar horizontes que fujam dos clichês da zona sul do Rio de Janeiro, a produção do filme nos permite aprofundar sob os panoramas do Centro e da Zona Norte, onde cresci, e seus respectivos contrastes com o resto da cidade. Em um local tão pulsante como as terras flumineses, a realização de “Pássaro Memória” nos permitiu explorar outras formas da nossa cidade.
Em que cores a sua fotografia apostou para “tingir” esse Rio em sua vertente mais idílica?
Leonardo Martinelli: Pelo fato de o Rio ser uma cidade repleta de contrastes e dicotomias obsoletas, buscamos retratar na fotografia um Rio de Janeiro que expressasse inicialmente um mundo binário de luzes e sombras. Tudo que não está sob o sol fica subexposto, até certo momento, de forma que não conseguimos identificar a textura do que está nas sombras. Essa atmosfera opressora tinha como um de seus objetivos a representação visual da violência simbólica presente em certos espaços da cidade, onde alguns corpos não podem habitar plenamente. Nesse sentido, a cidade atua como um objeto de disputa a partir da sua representação na fotografia do filme.
Seu curta anterior, “Fantasma Neon”, teve lançamento comercial nas telas brasileiras, onde o maior problema atual é a ausência de uma política de cota de tela. Como esse problema da ocupação de espaços pode ser resolvido?
Leonardo Martinelli: Agradeço muito à Vitrine Filmes pela rara oportunidade de conseguirmos colocar um curta nacional em cartaz comercialmente. Como você aponta, o cinema nacional de longa metragem já enfrenta dificuldade para conseguir ocupar as telas, então um curta estar nesses espaços é ainda mais difícil. A ausência de uma política de cota de tela resulta dessa falta de regulamentação de um sistema que incentive os cinemas a exibirem uma quantidade mínima de produções nacionais. Esse é um problema enfrentado por muitos países, incluindo o Brasil, onde filmes estrangeiros muitas vezes dominam as telas e dificultam a exposição de filmes locais. Acredito que precisamos de cota de telas e leis de incentivo para lutar contra essa lógica predatória de mercado.