Rodrigo Fonseca
Com exibição no Brasil assegurada pelo Festival Varilux, cuja 10ª edição vai de 6 a 19 de junho em todo o país, “Graças a Deus”, o novo longa-metragem de François Ozon, coroado com o Grande Prêmio do Júri na Berlinale, já está na marca de um milhão de pagantes em sua terra natal, a França. Centrado num caso real sobre pedofilia na Igreja Católica, com julgamento marcado para março, a produção, batizada “Grâce à Dieu” em sua língua materna, é um drama que passa longe do rótulo de “filme pop” – uma expressão muitas vezes associada ao cineasta parisiense de 51 anos. Em cartaz em telas francesas há cerca de 45 dias, o longa-metragem virou um acontecimento midiático no 69. Festival de Berlim. O tema, espinhoso, atrai por sua urgência. Mas neste caso, há uma grife popular por trás de sua direção que amplia a curiosidade.
“Tentei seguir um ritmo narrativo que traduzisse o estado de espírito do meu trio de protagonistas. Filmes políticos propõem respostas, trazem soluções. Eu não fui pelo lado político, mas sim por uma mirada mais humana, das vítimas dos abusos pedófilos. É um ‘filme-cidadão’. Ele quer abrir debates, tendo alguma utilidade pública”, disse Ozon à Berlinale.

Realizador de êxitos populares como “Potiche – Esposa troféu”, de 2011, ele é um
caso raro de diretor que agrada a crítica, conquista prêmios e lota salas de exibição em filmes de bilheterias milionárias como “8 mulheres” (2002) e “Dentro da casa” (2012). “Trabalhar me dá prazer, por isso eu filmo muito, e não me sinto em dívida com a tradição do cinema francês do passado. Eu conto histórias do meu tempo, à minha maneira, sem obrigações com o lastro histórico da Nouvelle Vague”, disse Ozon ao Lab Pop, quando seu filme anterior, o suspense erótico “O amante duplo”, foi ovacionado no Festival de Cannes, em 2017.

Foi ali que ele começou a preparar “Graças a Deus”, centrado na história de três homens abusados por um mesmo padre na infância – Alexandre (papel do galã Melvil Poupaud), Emmanuel (Swann Arlaud) e François (Denis Ménochet, em uma brilhante atuação) – que decidem levar o sacerdote à Justiça.

No auge de sua potência artística, o diretor parisiense deu à Berlinale não apenas seu filme mais polêmico, como atraiu para o evento olhares que vão muito além da indústria cinematográfica. Até a imprensa especializada em religião está de olho no impacto que “Grâce à Dieu” possa trazer para a rotina da diocese de Lyon, onde os crimes recriados ocorreram, e do Vaticano. A julgar pelos elogios ao sofisticado roteiro, o longa agradou.

p.s.: Mito das telas, Alain Delon, hoje com 83 anos, vai receber uma Palma de Ouro de Honra no 72º Festival de Cannes, que vai de 14 a 25 de maio. “Bacurau”, de Kleber Mendonça e Juliano Dornelles, já foi confirmado como um dos concorrentes do evento.