Cannes, Cinema

A ‘Bruma’ de Carpenter leva o horror à Cinemateca Francesa

Por Laboratório Pop

RODRIGO FONSECA
Já virou tradição da Cinemateca Francesa, em Paris, encerrar o ano com iguarias pop, vide uma recente projeção de “Stallone Cobra” (1986) antes do Réveillon. Neste fim de 2024, o templo da cinefilia do Velho Mundo exibe uma retrospectiva de pérolas do horror, com mestres como Kiyoshi Kurosawa, Lucio Fulci, Tobe Hooper e Dario Argento. Inclua com destaque nesse bonde o artesão autoral americano John Carpenter, que mobiliza a instituição na noite deste sábado. Vai rolar sessão de “A Bruma Assassina” (“The Fog”, 1980) na Salle Henri Langlois. A projeção é uma forma de a França celebrar, antecipadamente, os 77 anos do diretor, que comemora seu aniversário no dia 16 de janeiro. Em 2019, ele ganhou o troféu Carroça de Ouro da Quinzena de Cineastas do Festival de Cannes, pelo conjunto de seus cults, entre eles “Halloween” (1978), “O Enigma do Outro Mundo” (1982) e “Eles Vivem” (1988).
O site da Cinemateca é austero ao se referir à potência estética de “A Bruma Assassina”, que custou US$ 1,1 milhão e faturou 20 vezes mais:
“Inspirado por uma visita a Stonehenge, Carpenter evoca Edgar Allan Poe e Lovecraft em um tributo aos clássicos do terror, criando angústia por meio do que está fora da tela. Um filme atmosférico com uma atmosfera sufocante, ‘Fog’ é, acima de tudo, uma crítica mordaz à sociedade americana, onde fantasmas e monstros espreitam nas sombras”.
Na trama escrita por ele e Debra Hill, as comemorações do centenário da fundação de uma pequena cidade californiana são prejudicadas pela revelação de um segredo ligado aos fundadores, que é descoberto quando um espesso nevoeiro encobre o local. Com a chegada dessa massa de ar, várias pessoas começam a morrer. Adrienne Barbeau e Jamie Lee Curtis estão no elenco.
“O cinema de horror é político, crítico por natureza, o que exige de seus realizadores a necessidade de se trabalhar de forma independente da vontade dos estúdios de Hollywood”, disse Carpenter em uma entrevista Associação de Críticos do Rio de Janeiro para a feitura do livro “O Medo É Só O Começo”, onde faz um balanço de sua carreira. “No assombro, encontrei um espaço para criar”.

Bilheteria de US$ 20 milhões fez de “A Bruma Assassina” um sucesso pop em 1980

Hoje, ele vive das trilhas sonoras que compõe e de direitos autorais de seus roteiros, além de ter seu repertório sempre reprisado em TVs ou apresentado em festivais de classe AA, vide Cannes. Com a fama de ter um temperamento de indigesto para o padrão das grandes corporações de Hollywood, Carpenter acabou perdendo espaço como diretor depois do fracasso comercial de “Fantasmas de Marte”, em 2001. Seu último sucesso de bilheteria, “Vampiro$”, já contabiliza 20 anos. Porém, seus longas de juventude como “O enigma do outro mundo” (1982) e “Assalto à 13ª DP” (1976) são citados como referência por realizadores do mundo todo, de Quentin Tarantino a Kleber Mendonça Filho. Há uns três anos, versões em quadrinhos de dois de seus maiores êxitos de público. “Os aventureiros do bairro proibido” (1986) e “Fuga de Nova York” (1981) se tornaram best-sellers nos Estados Unidos, desafiando a hegemonia dos heróis da DC e da Marvel na venda de HQs. E toda hora surge um novo remake de seus clássicos.
“Estou velho, cansado de trabalhar, mais interessado em me distrair e em receber os cheques gordos que me pagam para refazer minhas ideias do passado”, disse ele em entrevista ao “The New York Times” no início do ano, antes de ser convidado pelo festival de Veneza. “Não é mau envelhecer com as pessoas te pagando para usar o seu nome em versões requentadas de filmes que me deram muito trabalho no passado”.