Rodrigo Fonseca
Olivier Assayas será o presente de Páscoa da cinefilia brasileira na Semana Santa: dia 18 estreia por aqui o festejado “Vidas duplas” (“Doubles vies”), sensação do último Festival do Rio e um dos títulos mais elogiados da seleção de Veneza, em 2018, na disputa pelo Leão de Ouro. Seu realizador já é de casa: esteve em solo carioca em outubro e fechou um projeto de longa (hoje esperadíssimo) com o produtor carioca (radicado em SP) Rodrigo Teixeira (de “Me chame pelo seu nome”). Teixeira produz “Wasp network”, thriller com Penélope Cruz, Wagner Moura, Pedro Pascal e Edgar Ramirez e Gael García Bernal baseado no livro “Os últimos soldados da Guerra Fria”, de Fernando Morais. O projeto revive a história da Rede Vespa, grupo de espiões a mando de Cuba incumbidos de vigiar redes anticastristas nos EUA. O IMDB (Internet Movie Database, mais popular banco de dados do audiovisual na web), diz que esse novo exercício autoral do realizador de “Depois de maio” (2012) só será lançado em 2020. Mas, até lá, dá pra matar as saudades da estética existencial de Assayas a partir de sua comédia de costumes que inflamou debates sobre mídias digitais em solo veneziano.
“Hoje, há muita gente lendo, mas o que me irrita nesse debate sobre produção cultural é o fato de haver um populismo político barateador que difunde um certo desprezo à intelectualidade e ao ritual de se conversar sobre aquilo que lemos. Refletir virou um verbo careta para uma sociedade que quer gratificações imediatas. Como isso temos uma massa cada vez mais deseducada de um lado e, do outro, uma massa que reage, armando-se de um sólido ferramental literário e ensaístico, mas se isola em seu saber e sua arrogância”, disse o diretor ao Lab Pop em sua passagem pelo Rio.
Pautado num confronto entre o editor de livros Alain (Guillaume Canet) com os avanços tecnológicos do mercado livreiro (afoito por e-Books e blogs), “Vidas duplas” cria uma trama complementar, ligada também a conflitos sobre a transformação virtual das relações humanas, com a crise da atriz Selena (Juliette Binoche) com sua escravidão a séries de televisão. É um dos filmes mais elogiados de Assayas, que viu sua carreira galgar outro patamar de respeito após conquistar o prêmio de melhor diretor em Cannes, em 2016, com o filme de fantasma “Personal Shopper”.
“Existe um fascínio nas redes sociais pela expressão de opiniões a qualquer custo, sem pausa pra reflexão”, disse Juliette Binoche, em sua passagem pelo Festival de Berlim, em fevereiro, como presidente do júri. “Como atriz, tento valorizar o silêncio”.