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Com Djo, Joe Keery está bem longe de ser o cara de Stranger Things

Seu novo álbum, The Crux, traz pop bom e legítimo com McCartney e anos 80

por Robert Halfoun

Joe Keery está cada vez mais longe de ser só o cara do cabelo perfeito em Stranger Things. Em The Crux, seu terceiro disco sob o nome Djo, ele assume um novo papel: o de curador de sensações. Oi?

Ao reunir uma coleção de histórias individuais, cada uma com sua estética, clima e dilema emocional próprio, ele faz o papel de uma espécie de contador de histórias que, por exemplo, reúne os seus personagens num hotel fictício (a sugestão vem da capa do disco), onde cada quarto é habitado por um sujeito à beira de uma decisão. E onde cada música é a chave que abre a porta para rupturas, dúvidas, identidades fragmentadas e mudanças de rumo.

Keery, que despontou como o carismático Steve Harrington em Stranger Things, nunca tratou a música como um projeto paralelo qualquer. Desde Twenty Twenty (2019) e Decide (2022), vem lapidando uma identidade sonora que mistura sofisticação pop, pegada nostálgica e um senso narrativo muito próprio.

Mas é em The Crux que ele parece ter encontrado seu ponto de equilíbrio: um disco conceitual com forma clara, conteúdo emocional e aquele brilho estranho dos anos 1980 filtrado por um olhar de 2025 (e algo do indie do começo dos 90).

O álbum foi gravado no Electric Lady Studios, em Nova York – o tipo de lugar que carrega história nas paredes – e tem produção compartilhada com Adam Thein. O som é carregado de camadas: sintetizadores vibrantes, guitarras econômicas e timbres que poderiam facilmente ter saído de McCartney II ou Press to Play.

A influência de Paul McCartney nessa fase mais experimental e eletrônica é evidente não só nos arranjos, mas na ousadia melódica. Keery também parece não ter medo de parecer excêntrico – e isso é um trunfo.

Faixas como “Basic Being Basic” e “Afterglow” fazem esse aceno direto aos anos 1980, com batidas programadas e baixos pulsantes, mas sem jamais soar como pastiche. São composições que misturam melancolia e leveza com muita inteligência pop.

“Charlie’s Garden”, uma homenagem afetiva a Charlie Heaton (Jonathan Byers em Stranger Things), transita entre o minimalismo sentimental e um groove dançante contido, em algo que lembra claramente o espírito de Pipes of Peace, de McCartney, mas com um toque contemporâneo.

O conceito do hotel não serve apenas como pano de fundo: ele dá unidade ao disco. Cada música soa como um retrato rápido, uma conversa ouvida atrás da porta. “Lonesome Is as Lonesome Does” inicia com um clima contemplativo, preparando o terreno para os personagens e suas incertezas ; “Delete Ya” é mais direta, mais performática, com refrões afiados e vocais modulados que funcionam como máscaras – ou armaduras.

The Crux é um disco sobre a busca por identidade, pelas escolhas certas no meio do caos da vida adulta. Mas Keery não dramatiza isso. Pelo contrário: ele encontra beleza na estranheza, e leveza no incômodo.

A estética é retrô, mas o conteúdo é profundamente atual.

Mais do que continuar a trajetória como Djo, Keery parece estar construindo um corpo de trabalho coerente, que reflete não só seu gosto musical, mas também sua visão de mundo. Como McCartney em sua fase solo nos anos 80, ele entende que pop pode ser esquisito, sensível, elegante – e que tudo isso pode coexistir no mesmo álbum.

Com bem definição a revista americana Rolling Stone, The Crux, definitivamente, não é um álbum comum. E um desses trabalhos bem cuidados que sugerem a escuta repetida. Cada volta pelo corredor desse hotel revela um detalhe novo: uma textura sonora, um ruído bem colocado, uma frase que ficou na cabeça.

E é assim que Keery nos convida a entrar – e talvez a não sair tão cedo.