Rodrigo Fonseca
Agendado de 22 a 30 de setembro, no norte da Espanha, na fronteira com a França, o Festival de San Sebastián vai ceder espaço em sua abertura para a cerimônia de premiação do filme eleito pela Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica (Fipresci) como o Melhor Longa-metragem do Ano: a dramédia romântica “Fallen Leaves” (“Kuolleet lehdet”), de Aki Kaurismäki. Laureada com o Prêmio do Júri em Cannes, a produção presta um tributo a Chaplin ao narrar o flerte que estabelece entre uma moça e um rapaz constantemente atropelados por contradições econômicas da Europa. O prestígio de seu realizador – o mais famoso cineasta finlandês – só fez crescer nos últimos anos e a força plástica de sua narrativa de tintas cartunísticas é reforçada agora que ele ganhou o endosso da mais prestigiada associação de críticos de cinema do mundo. A decisão acerca de quem receberia o Fipresci Grand Prix 2023 foi tomada numa enquete com 669 votantes do mundo todo. Tal votação é realizada anualmente desde 1999 e já coroou artistas do quilate de Maren Ade, Pedro Almodóvar, Paul Thomas Anderson, Alfonso Cuarón, Jean-Luc Godard, Ryusuke Hamaguchi, Michael Haneke, Richard Linklater, George Miller e Chloé Zhao.
Como vinha batendo forte em crises morais do Velho Mundo em seus longas mais recentes, vide o caso da imigração, retratado em “O Outro Lado Da Esperança” (prêmio de Melhor Direção na Berlinale, em 2017), Kaurismäki regressa com “Fallen Leaves” escancarando a ferida da Guerra da Urânia de maneira brilhante em seu novo roteiro. Há um rádio sempre com notícias contra a Rússia ligado na casa da protagonista, Ansa (Alma Pöysti) – primeiramente funcionária de supermercado, depois faxineira de bar e, por fim, uma operária de fábrica. Sua vida é monótona, solitária e embolorada. Até as lasanhas congeladas que compra dão mofo. Mas tudo muda quando ela se encanta por um homem sem nome que conhece num karaokê, vivido pelo brilhante Jussi Vatanen. Ele também se encanta por ela, vive só e carece de um benquerer pra chamar de seu. Seu problema: ele bebe. Muito. Na ciranda entre o álcool e uma paixão verdadeira, o personagem de Vatanen sofre uma reeducação afetiva. E a gente senta no banco escolar da empatia com ele, num filme de que dificilmente se esquece. É a simplicidade a serviço do lirismo.