“Cavalo dinheiro”, de Pedro Costa impactou a plateia das sessões de imprensa da 52ª edição do Festival de Nova York.
Como já tinha acontecido no Festival de Locarno – onde Costa ganhou o prêmio de melhor diretor – o filme também aqui despertou reações opostas. Enquanto muitos ficaram até o final em respeitoso silêncio, alguns deixaram a sala no meio da projeção.
No filme, a Revolução dos Cravos é o ponto central de uma fantasmagórica história onde as coisas não seguem uma narrativa convencional.
Sua origem tem início em 1994, quando o diretor foi a Cabo Verde rodar um filme (“Casa de lava”). Voltou com cartas de pessoas que conheceu lá para entregá-las a imigrantes cabo-verdianos que habitavam a vizinhança (hoje demolida) de Fontainhas, uma favela de Lisboa.
Após esse fato, decidiu filmar o que chamou de “Trilogia das Fontainhas” composta de: “Ossos” (1997), “No quarto da Vanda” (2000) e “Juventude em marcha” (2006). Neste último, que fecha a trilogia, o protagonista é Ventura, um imigrante cabo-verdiano, que está presente também em “Cavalo dinheiro” e, anteriormente, já esteve em outros curtas-metragens do diretor.
Numa espécie de “descida aos infernos”, são 103 minutos de uma viagem sem regresso no trem-fantasma de um Portugal assolado pela guerra colonial, pela revolução e pela descolonização, com Ventura como uma espécie de Orfeu em busca de uma Eurídice inexistente e perseguido pelas assombrações do seu passado.
O diretor trabalha com uma equipe mínima e vai pacientemente construindo uma linguagem cinematográfica única junto com homens e mulheres de quem ficou amigo.
Costa diz que “Cavalo dinheiro” é um filme nascido de histórias e conversas e que foi muito sofrido fazê-lo.
“Como nas colaborações anteriores com Ventura, muito do que está no filme foi dito por ele. Somos quase da mesma idade e estávamos no mesmo lugar quando ocorreu a Revolução dos Cravos. Eu tinha 13 anos e acho que tive muita sorte em ser um rapaz novo na época, quando descobri a música, a arte, a política…”, conta o diretor, ressalvando que não teve intenção de preservar essa memória.
“Ao longo da nossa amizade de 20 anos o Ventura tem-me contado histórias do que ele chama a sua prisão. Ele está muito doente, e tenta lembrar-se delas, mas talvez isso não seja uma boa coisa. Outras pessoas fazem filmes para recordar, mas este não, penso que é um filme para esquecer”, ressalta, dizendo que filmar “Cavalo dinheiro” foi muito difícil.
“O que há para dizer está nas telas e não foi fácil dizê-las. Foi devastador fazer ‘Cavalo dinheiro’”, reitera.
As afirmações surgidas que “Cavalo dinheiro” tem algo de expressionista ou alguma coisa de Murnau, são contestadas pelo diretor.
“O tempo é pouco para pensar nas coisas dessa maneira. Mas se essas referências estão visíveis, é porque são algo que estão dentro de mim, sempre estiveram e sempre estarão”, diz, acrescentando que o filme carrega semelhanças com outros trabalhos que já fez.
“Não houve especial diferença de método nem de abordagem entre este e os filmes anteriores”,explica o diretor de estilo único e inegavelmente um dos mais extraordinários criadores de imagens do cinema moderno.