RODRIGO FONSECA
Depois da atriz Meryl Streep, uma outra entidade audiovisual vai receber a Palma de Ouro Honorária do Festival de Cannes: os estúdios de animação Ghibli, do Japão. A láurea vai coincidir com a recente conquista da empresa na festa do Oscar, na qual foram premiados por “O Menino e a Garça”, de Hayao Miyazaki. O octogenário cineasta é a razão de essa grife animada existir e resistir como instância de produção autoral. Miyazaki é um marco vivo do desenho animado.
Há sempre cicatrizes da realidade histórica na obra do oscarizado diretor de “O Castelo Animado” (2004). Seus personagens são sempre signos de conflitos morais de sua pátria, vide o aviador Marco Porquinho, de “Porco Rosso”, ou a peluda criatura de “My Neighbor Totoro”, lançado em 1988. Ele ficou cerca de dez anos sem lançar longas entre 2013 e 2023, quando “O Menino e a Garça” (hoje parte do catálogo da Netflix) trouxe-o de volta.
Em meio a seu afastamento das longas, Miyazaki rodou um curta, “Boro The Caterpillar”, feito para ser exibida no parque temático do Ghibli, que adotou um sistema de marketing bastante inusitado para o lançamento do regresso de seu astro rei aos cinemas. Nada se falou, até os festivais de Toronto e de San Sebastián, sobre “O Menino e a Garça”. Nada se contou, nada se fez antecipar, e o cartaz original dele se resumia à imagem de um pássaro, sem qualquer conexão com a ideia antes divulgada de que seria uma trama sobre a educação sentimental de um rapaz. Seria e, de fato, é, pois esse é o eixo temático do cineasta, que sempre valorizou figuras corajosas e empoderadas de jovens mulheres como protagonistas, a jugar por sua princesa Mononoke.
Sua fauna de criações foi transformada em bonecos, lancheiras e camisetas, mostrando o interesse da indústria pop por esse Walt Disney asiático, que fez de Totoro seu Mickey. Um Mickey nada moralizante.
Uma terceira Palma de Honra será entregue no dia 25. Seu ganhador será o cineasta e produtor George Lucas, o criador de “Star Wars”.
Até o momento, na competição oficial pela Palma de Ouro, o título mais badalado é “Emilia Pérez”, musical de Jacques Audiard sobre um líder de um cartel do México que transiciona e assume uma identidade feminina. Nas mostras paralelas, a surpresa do festival é “The Surfer”, um thriller com Nicolas Cage tentando pegar onda numa praia infestada por valentões.