RODRIGO FONSECA
Para sua segunda noite de competição de longas-metragens, o Frest Aruanda, em sua 18ª edição, reservou uma produção chancelada por Cannes e mais uma série de festivais de forte prestígio: “Levante”.  Sempre que a Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica (Fipresci) concedeu sua láurea, definida como O Prêmio da Crítica, a um longa-metragem brasileiro, os caminhos dos títulos vencedores – e das vozes autorais por trás de sua direção – se abriram para o Infinito. Foi o que se viu com “Memórias do Cárcere” (1984), de Nelson Pereira dos Santos (1928-2018) ao ser laureado na Quinzena da Croisette; de “A Febre”, de Maya Da-Rin, em Locarno, em 2019; de “Pendular” (2017), de Julia Murat, galardoado em Berlim; e “O Som ao Redor”, que levou o mimo em Roterdã, em 2012. O mais recente filme nacional que agradou a Federação na Croisette foi o contundente drama de Lillah Halla, que foi revelado na Semana da Crítica de Cannes. Saiu de lá agraciado com o diploma dados por uma das instituições que mais e melhor preservam a dimensão transgressora da autoralidade nas telas. O júri escalado para o festival francês destacou a forma madura, nada submissa, com que a diretora paulista tratou o tema do aborto em seu longa, que é editado com a fluidez de um trem-bala pela sempre impecável Eva Randolph. Eva recebeu a láurea de Melhor Montagem no Festival do Rio, onde Lillah foi agraciada com o troféu Redentor de Melhor Direção.
“Entendo que o cinema tem espaços de poder e, por isso mesmo, é importante mostrar que um objeto como esse meu filme pode ter força, na criação de espaços seguros, para gerar debates”, disse Lillah ao Lab Pop em Cannes.
Egressa do Teatro e formada pela Escuela de San Antonio de Los Baños, em Cuba, Lillah assina a direção apoiada na força da atriz Ayomi Domenica Dias. Junto dela, e de um elenco em fina integração, ela constrói uma trama sobre os dilemas morais mais medievais do país, dissecados a partir do processo de uma jovem atleta que engravida sem desejar e opta por abortar. Mas vai enfrentar resistências por isso.
“Existe o termo ‘militância estética’, mas a estética que me interessa aqui é resultado de um processo que se dá no simbolismo de uma quadra de vôlei, com dois lados se chocando, separados por um limite tênue”, diz Lillah durante a vitória em Cannes. “É um filme que nasceu de uma estratégia coletiva, absorvendo tudo o que aconteceu no Brasil no período em que seu roteiro foi sendo desenvolvido. Buscamos representar um futuro possível”.
Vai ter Fest Aruanda até 7 de dezembro.