RODRIGO FONSECA
Sintonizado com uma tradição de cartografias geopolíticas que acha eco de Silvio Tendler a Errol Morris, “Utopia Tropical”, de João Amorim, deu a largada no mata-mata da Première Brasil 2023, no gramado dos longas-metragens de não ficção. Estudo sobre o desarranjo da harmonia social, a partir do avanço das grandes corporações comerciais e industriais, o longa equilibra uma tonelada de imagens de arquivo numa gradação crescente de pressão em sua edição. A montagem requintada de Tainá Menezes é suave, porém, atenta à tensão inerente aos debates acerca da inflação, de formas de governo conservadoras e do “Game of Thrones” no bastidor do Golpe de 2016. O linguista Noam Chomsky e o diplomata Celso Amorim entram na narrativa não como tema, mas como personagens. Não é um filme SOBRE eles, mas, sim, COM eles, numa forma de explorar a História e, sobretudo, a Economia que utiliza a semiologia de forma lúdica. O estudo de signos já enferrujados de apresentação e mesmo de representação de grandes governos é feito por meio de intervenções animadas, assinadas por César Coelho. Um dos fundadores e curadores do Anima Mundi, César expande plasticamente as proposições trazidas por Chomsky e Celso, na divertida sacada de adotar uma águia sinistra como símbolo dos EUA. Já a China é expressa por um panda fofo.
No trecho final, os Amorins (o pai, na fala; o filho, na direção) fazem um lúcido balanço dos solavancos sofridos pelo país com o Impeachment de Dilma Rousseff e a eleição de Bolsonaro, fazendo um retrospecto das situações mais tragicômicas vividas por esta pátria.
Tem mais uma projeção do longa neste sábado, 7 de outubro, às 13h30, no Cine Odeon.