RODRIGO FONSECA
Antes ou depois de dar um pulinho num cinema perto de você, para prestigiar “O Auto da Compadecida 2” e “Sonic 3” em tela grande, dá uma zapeada no streaming, na Prime Video da Amazon ou na MAX, e se delicie com a excelência de Clint Eastwood em “Jurado n°2” (“Juror #2”). Não teve espaço para essa joia em circuito no Brasil. Fino estudo sobre ética, consciência pesada e arrependimento, o novo (e talvez o último) filme com direção de Clint (hoje com 93 anos) teve uma carreira restrita em salas de projeção americanas. Assim mesmo, esse misto de thriller e drama de tribunal gabaritou-se para a Oscar Season, a temporada de premiações anterior à cerimônia anual da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. Chegou a ser eleito um dos dez melhores filmes de 2024 segundo o National Board of Review. No enredo, o jornalista Justin Kemp (Nicholas Hoult, em sublime atuação), devotado na luta contra o alcoolismo, é escalado para o júri de um caso de feminicídio. Assume o posto sob um dilema, ao supor que ele possa ter sido o assassino, num acidente de trânsito que cometeu sob o efeito da bebida, após um porre. Hoult, dublado por Philippe Maia, será visto já, já em nossos cinemas no elenco de “Nosferatu”, de Robert Eggers.
Na trama filmada por Eastwood, com base num argumento do dramaturgo Jonathan Abrams, Kemp preserva sua sobriedade nos Alcoolistas Anônimos (AA), sobretudo sob os conselhos de seu padrinho, Larry (Kiefer Sutherland, o Jack Bauer de “24 Horas”). Estar sóbrio, entretanto, não expia sua angústia de ser (possivelmente) o culpado da morte discutida em “Juror #2”. Ao perceber os pré-conceitos de seus e de suas colegas, as juradas e os jurados, mobilizados por uma promotora de verve justiceira, Faith (a sempre inspirada Toni Collette, que foi mãe de Hoult em “Um Grande Garoto”), Justin cai mais fundo no fosso do tormento. Esse buraco já foi explorado por Eastwood antes, em “Sobre Meninos e Lobos” (2003).
Parceiro habitual de Eastwood de 1977, Joel Cox assina a montagem de “Jurado N°2”, o que assegura o equilíbrio entre tensão e reflexão. Yves Bélanger assina a fotografia, buscando um tônus claustrofóbico nos enquadramentos, sempre com cores rebuscadas. A produção teve um orçamento de US$ 35 milhões. Na versão brasileira, Mônica Rossi dubla Collette.
Estima-se que em 2025 o crítico, curador e documentarista Mario Abbade, autor de “Eastwood´s Rawhide” (Editora Casa de Papel), lance um catálogo de luxo sobre o realizador de “Menina de Ouro” (“Million Dollar Baby”), que hoje pode ser visto na plataforma MUBI. Um estrondo de bilheteria, essa produção, que custou US$ 30 milhões e faturou US$ 216 milhões, está comemorando 20 anos. Lançado em 2004, sem alarde, esse drama esportivo, baseado no livro “Rope Burns: Stories from the Corner”, de F.X. Toole, ganhou quatro Oscars: Melhor Filme, Direção (para Eastwood), Atriz (Hilary Swank) e Ator Coadjuvante (Morgan Freeman). Ímã de lágrimas, sua trama acompanha a peleja de uma jovem de origem pobre, Maggie (Hilary), para se firmar no pugilismo, treinando na academia do severo Frankie Dunn, vivido por Clint num de seus melhores desempenhos. Num ambiente majoritariamente masculino, Maggie é uma ave rara, dedicada e cheia de destreza. Com o apoio de Frankie, ela começa a acumular vitórias e se torna uma estrela, mas uma surpresa azeda do destino pode mudar os rumos de sua estrada.