A organização do Grammy não reservou um lugar na plateia, entre as estrelas, para Milton Nascimento ficar ao lado de Esperanza Spalding, quando concorriam ao prêmio de Melhor Álbum de Jazz Vocal.
Disseram que os lugares diante do palco eram apenas para as estrelas que eles queriam que aparecessem na televisão. Ô, gente estúpida…
Bora de aulinha de discoteca básica: o Clube da Esquina, de 1972, não é apenas um disco, é um movimento. É um divisor de águas, uma obra-prima atemporal não só da música brasileira, mas da música mundial.
Se um dia a humanidade não existir mais e restar apenas uma mídia qualquer com os principais discos da história, Clube da Esquina estará lá.
Quietos, mineiríssimamente, Milton Nascimento e Lô Borges reuniram um coletivo de músicos da pesada (Beto Guedes, Wagner Tiso, Toninho Horta e Ronaldo Bastos, entre outros) para gravar o álbum que, numa tacada só, de forma personalíssima, mistura MPB com Beatles, com rock progressivo, com southern rock, com jazz, com música folclórica e ritmos latino-americanos.
Clube da Esquina é um álbum à frente de seu tempo, da primeira a última faixa. Ele marca um momento de renovação estética e cultural, influenciando gerações de artistas no Brasil e no exterior. Músicas belíssimas, Milton cantando lindamente, arranjos sofisticados, harmonias complexas, uso de múltiplas camadas sonoras e uma fusão inusitada de tanta coisa. Por exemplo, se “Cravo e Canela” tem algo de psicodélico, “Cais” pode ser uma sinfonia. O que falar de “Tudo Que Você Podia Ser”?
Definitivamente, não dá para ficar citando canções num disco desse tamanho. “Um Girassol da Cor de Seu Cabelo”, “Nada Será Como Antes”, “O Trem Azul”, “Saídas e Bandeiras”, “Um Gosto de Sol”… A lista não acaba, em magníficas 1 hora e quatro minutos de música.
Paul McCartney ouviu, David Gilmour ouviu, Tom Yorke ouviu… Tanta gente boa ouviu (ouve!) e aplaudiu (aplaude!) de pé. Só o Grammy que não.
Aliás, como também não toma conhecimento da obra imortal de Milton Nascimento, de álbuns como Minas (1975), Geraes (1976) e Travessia (1967) – que, aliás, ganhou um Grammy.