Myrna Silveira Brandão, de Berlim
Fotos de Maria Antônia Silveira Gonçalves e Divulgação

Ao fazer o anúncio da Panorama desta 70ª edição do festival de Berlim, Michael Stütz, diretor da Mostra, disse “Que em meio a tantas crises globais, o cinema encontre estímulos para mudanças”.Um exemplo disso é o documentário paraense “O reflexo do Lago” de Fernando Segtowick, selecionado para a mostra e exibido nesta segunda (24) numa concorrida sessão e muitos aplausos ao final.

O documentário procura responder às questões da construção da hidrelétrica em Tucurui, no Pará, realizada na década de 1970, e quais impactos causam até hoje na comunidade local que vive com traços de desmatamento por décadas.

O diretor toma a construção da represa como ponto de partida para uma investigação sobre a exploração passada e presente da região, retratando o esgotamento da Amazônia com imagens assustadoras.

Antes da sessão, Segtowick em entrevista ao LABORATÓRIO POP, falou sobre o filme, sua motivação para realizá-lo, o simbolismo do título do documentário e os resultados que espera.

Qual a motivação para realizar “O reflexo do Lago”?

“É uma longa história. Meu pai é engenheiro eletricista, eu estudei engenharia quatro anos, depois abandonei e fui para o jornalismo audiovisual. Visitei Tucuruí quando estudante. Muitos anos depois, me deparei com o livro de fotografias “O lago do esquecimento”, da fotógrafa Paula Sampaio, sobre as árvores mortas no lago e os depoimentos de moradores da região. Ali estava plantada a semente”.

Foi difícil o trabalho de pesquisa?

“Sim. Após conseguir o apoio para o trabalho, me encontrei com a pesquisadora Edilene Portilho, cuja família é moradora do lago e me apresentou para todo esse universo. A partir daí foram inúmeras visitas ao local, conhecendo as pessoas, os lugares, me aprofundando na sua história. Também entrevistei o Lúcio Flávio Pinto, jornalista muito importante da região”.

Quanto tempo levou da ideia do projeto à finalização do filme?

“O projeto demorou quatro anos até chegar a essa versão final, que foi selecionada para a Berlinale. No processo me preocupava também contar uma história de cunho social e político, mas sem perder o lado cinematográfico do projeto. Nesse sentido, contei com dois grandes parceiros: o diretor de fotografia Thiago Pelaes e o montador Frederico Benevides, que construíram este filme comigo. É claro que neste momento em que se discute a Amazônia, é importante que o “Reflexo do Lago” chegue para trazer uma camada de reflexão que o próprio título do filme já aponta”.

O que representa essa seleção do filme para a Berlinale?

“O projeto só foi possível graças a políticas públicas de fomento ao audiovisual, em especial a cota de 30% de recursos para filmes das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Chegar até Berlim faz parte de um aprendizado como realizador e produtor. O audiovisual é um investimento de longo prazo. Desde meu primeiro curta-metragem, demorei 20 anos para realizar o longa. Dessa forma, a seleção na Berlinale é uma prova do resultado concreto dessas políticas”.

Qual sua expectativa quanto à receptividade do público?

“É minha primeira vez no festival. Estou bem curioso para ver como os espectadores vão reagir. Sei que as sessões no festival são concorridas e que a audiência é bem participativa”.